quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

INCONSTITUCIONALIDADE DO REGULAMENTO DISCIPLINAR


Posted: 28 Nov 2011 07:08 AM PST
Muito infelizmente, estou temporariamente impedido de comparecer às reuniões agendadas pelo SOS Bombeiros. Minha vontade de estar lá é imensa! Movido pela obrigação de contribuir com o movimento, que é estritamente compassado com a legalidade, atendi o pedido do Daciolo e enviei um farto material sobre a inconstitucionalidade de nosso regulamento disciplinar.

O site Policial BR publicou um texto excelente sobre a inconstitucionalidade dos regulamentos disciplinares do Exército e das Forças Auxiliares. É o texto que publico logo abaixo. Aproveitem e levem para as reuniões. Grande abraço a todos!



A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 DIZ QUE NINGUÉM PODE SER PRESO SE NÃO EM RAZÃO DE LEI. O RDE É UM DECRETO, LOGO NÀO PODE SER USADO PARA PRENDER NINGUÉM.
A ilegalidade da aplicação das punições disciplinares de impedimento disciplinar, detenção e prisão previstas no art. 24, incisos II, IV e V, do Decreto n° 4.346/02, diante da não recepção do art. 47 da Lei n° 6.880/80 pela CF/88.
A CF/88 em seu art. 5°, inc. LXVIII prevê que “conceder-se-á 'habeas corpus' sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”.
No que tange a previsão do art. 142, § 2°, da CF/88, o qual prevê “Não caberá habeas corpus em relação a punições disciplinares militares” é pacífica a jurisprudência pátria quanto à possibilidade de impetração do writ em relação a punições disciplinares, mormente quando a prisão for decretada em flagrante ilegalidade ou abuso de poder, vedado, tão-somente, o exame de mérito. Veja-se excerto da jurisprudência do STF, verbis:
"não há que se falar em violação ao art. 142, § 2º, da CF, se a concessão de 'habeas corpus', impetrado contra punição disciplinar militar, volta-se tão-somente para os pressupostos de sua legalidadeexcluindo a apreciação de questões referentes ao mérito" (STF, 2ª Turma, RE nº 338840/RS, Rel.ª Min.ª Ellen Gracie, DJ 12/09/2003) (g.n)
O ordenamento jurídico pátrio, nos fundamentos da CF/88, art. 5°, inc. LXI, prevê, verbis:
“LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militardefinidos em lei;” (g.n)
Vê-se, claramente, que o legislador constitucional teve o intuito de estabelecer a necessidade de lei delimitadora das hipóteses não apenas para os crimes, mas também para as transgressões disciplinares.
O que se vê nas punições disciplinares (prisão, detenção e impedimento disciplinar), é que a sanção aplicada ao paciente, na maior das vezes, está a restringir a locomoção do militar e, dessa forma, só poderiam ser validamente aplicadas caso houvessem sido definida em lei stricto sensu, o que invariavelmente, tem a reserva legal como forma de se coibir o arbítrio e o abuso da Administração Pública, mormente na caserna, quando da aplicação da sanção disciplinar.
Destarte, com a entrada em vigor da CF/88, houve a revogação do art. 47, da Lei n° 6.880/80, mormente com relação às transgressões militares que restringem a liberdade de locomoção, como a detenção disciplinar, o impedimento disciplinar e a prisão disciplinar previstas no Decreto regulamentar, como ocorre hoje no Exército Brasileiro, com a edição do Decreto n° 4.346, de 26 de agosto de 2002, que aprovou o Regulamento Disciplinar do Exército (R-4).
Dessa forma, não restou o Decreto supramencionado recepcionado pelo novo ordenamento constitucional, pois incompatível com o disposto em seu art. 5°, inc. XLI.
Conseqüentemente, viciada está a edição do decreto n° 4.346, pois fulcrada em norma legal não recepcionada pela Constituição Federal vigente, o que, invariavelmente, viciou o plano de validade de toda disposição regulamentar contida no referido decreto, referente à aplicação das penalidades de impedimento disciplinar, detenção e prisão disciplinares, ou seja, inc. II, IV e V do art. 24.
Não se trata aqui da inconstitucionalidade do Decreto que aprovou o Regulamento Disciplinar do Exército, até porque a jurisprudência do STF já se firmou no sentido de que não cabe Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) com relação a dispositivos de Decreto que regulamenta Lei, pois a questão nesse caso se coloca no plano da legalidade e não da constitucionalidade. (MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA nº 763/SP, Relator Min. Moreira Alves, publicada no DJU em 26/02/93, p. 02355).
Em verdade a inconstitucionalidade do Regulamento Disciplinar do Exército (RDE) já foi submetida à apreciação do Supremo Tribunal Federal, nos autos da ADI n° 3.340, a qual foi ajuizada pelo Procurador-Geral da República, sendo que o Plenário, por maioria de votos, não conheceu da ação. O julgamento foi em 03 de novembro de 2005.
Portanto, como bem asseverou o Desembargador Federal do TRF da 4ª Região, ÉLCIO PINHEIRO DE CASTRO, verbis:
“... a matéria a ser examinada resume-se à incompatibilidade material do artigo 47 da Lei 6.880/80 com a Magna Carta, especialmente em relação ao art. 5º, inciso LXI, verbis:
"Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem expressa e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei."
Efetivamente, em atenção ao secular princípio de que inexiste pena "sem prévia cominação legal" (nulla poena sine praevia lege) também expresso na Constituição de 1988, não se há de admitir em um regime democrático o estabelecimento de penas restritivas de liberdade (prisão ou detençãosem que tais sanções tenham sido fixadas por lei, aprovada pelo Congresso Nacional.
Desse modo, não se pode afirmar que o artigo 47 da Lei 6.880/80 foi recepcionado pela Constituiçãoeis que com ela se mostra incompatível, pois quando delegou competência ao regulamento para "especificar e classificar as contravenções ou transgressões disciplinares", bem como "estabelecer as normas relativas à amplitude e aplicação das penas disciplinares" incidiu em manifesta contrariedade ao apontado inciso LXI do artigo 5º da CF, o qual, como visto, exige que as hipóteses de prisão por transgressão militar sejam definidas em lei.”
Aliás, este é também o entendimento do TRF da 4ª Região, 8ª Turma, que no Recurso Criminal em Sentido Estrito n° 2004.71.02.008512-4/RS, que por UNANIMIDADE, decidiu, verbis:
“...
3. Ao possibilitar a definição dos casos de prisão e detenção disciplinares por transgressão militar através de decreto regulamentar a ser expedido pelo Chefe do Poder Executivo, o art. 47 da Lei nº 6.880/80 restou revogado pelo novo ordenamento constitucionalpois que incompatível com o disposto no art. 5º, LXI. Conseqüentemente, o fato de o Presidente da República ter promulgado o Decreto nº 4.346/02 (Regulamento Disciplinar do Exército) com fundamento em norma legal não-recepcionada pela Carta Cidadã viciou o plano da validade de toda e qualquer disposição regulamentar contida no mesmo pertinente à aplicação das referidas penalidades, notadamente os incisos IV e V de seu art. 24. Inocorrência de repristinação dos preceitos do Decreto nº 90.604/84 (ADCT, art. 25).” (g.n)
Nosso entendimento é corroborado também pela doutrina, vejamos os ensinamentos dos doutos juristas, verbis:
José Afonso da Silva
"é absoluta a reserva constitucional de lei quando a disciplina da matéria é reservada pela Constituição à leicom exclusão, portanto, de qualquer outra fonte infralegal, o que ocorre quando ela emprega fórmulas como: a lei regulará, a lei disporá, a lei complementar organizará, a lei criará, a lei definirá, etc." (in Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 1997) (g.n)
Eliezer Pereira Martins
"pode (...) cometer o equívoco de entender-se que quando o legislador constitucional pede uma lei para integrar a eficácia da norma contida na Constituição, está na realidade referindo-se à lei 'lato sensu' (medidas provisórias, decretos, portarias, etc.). Tal interpretação, contudo, em sendo feita de modo genérico, como mostraremos, é rematado erro hermenêutico, já que no universo das disposições restritivas da liberdade individual, a lei a que se refere o legislador é sempre o ato que tenha obedecido o processo legislativo como elemento de garantia do princípio da legalidade e mais exatamente da reserva legal. Ora, é cristalino que decreto não é lei. Na melhor doutrina, aquele é instrumento de regulamentação nos estritos limites da lei que o ensejou"
(in Direito Administrativo Disciplinar Militar e sua Processualidade. São Paulo: Editora de Direito, 1996, p. 86)

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